Direito Laboral: Aposentadoria especial e riscos no ambiente de trabalho

De acordo com o Decreto 3.048/99, anexo IV; NR 15 e seus anexos ou na lista LINACH (Lista Nacional de Agentes Notadamente Cancerígenos):
Quem trabalha em ambiente agressivo à saúde, sendo esta situação prevista no referido Decreto detêm expectativa de direito a concessão de aposentadoria especial.

Apesar do que muitos possam pensar, a aposentadoria especial não se trata de benefício ao trabalhador, e sim compensação pelo exercício de atividade laborativa que gera uma expectativa de vida menor ou com grande probabilidade de contrair alguma enfermidade, face aos agentes agressivos presentes nos processos ou no próprio ambiente de trabalho, vide artigo 57 da Lei 8.213/91 e anexo IV Dec 3048/99.

Quanto à insalubridade, é possível eliminar ou neutralizar, permitindo que a empresa deixe de pagar o adicional legal?

Sim! É possível eliminar o pagamento do adicional de insalubridade desde que a empresa adote as medidas administrativas e de gestão de segurança e medicina do trabalho que neutralizem ou eliminem o agente insalubre.

Em que pese possuir natureza salarial, o adicional de insalubridade é modalidade de salário-condição , ou seja, é parcela paga ao trabalhador em razão do exercício de suas atividades laborais sob determinadas condições, eliminado o agente insalubre, o empregado não mais faz jus ao respectivo adicional, uma vez que este possui natureza de salário-condição.

Conforme preleciona a NR 15, anexo 15.4.1 – A eliminação ou neutralização da insalubridade deverá ocorrer:

1. Com a adoção de medidas de ordem geral que conservem o ambiente de trabalho dentro dos limites de tolerância;

2. Com a utilização de equipamento de proteção individual.

Já a Súmula 289 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) entende que “o simples fornecimento do aparelho de proteção pelo empregador não o exime do pagamento do adicional de insalubridade. Cabe-lhe tomar as medidas que conduzam à diminuição ou eliminação da nocividade, entre as quais as relativas ao uso efetivo do equipamento pelo empregado.”

Para eliminar o pagamento de adicional de insalubridade com uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) e Equipamento de Proteção Coletiva (EPC), é preciso comprovar a sua eficácia. Neste aspecto, teremos a segurança jurídica empresarial.

Com o advento do e-Social, a Previdência Social acompanha se a empresa está custeando o FACET (6%, 9% ou 12%) sobre a folha de salários dos trabalhadores expostos.

A inteligência do art 58 da Lei 8.213/91, versa sobre o tema e  traz o seguinte texto:

A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário (PPP), na forma estabelecida pelo INSS, com base em LTCAT, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista.   

Isso não significa que a empresa deixará de efetuar o pagamento do financiamento da aposentadoria especial (FACET). 

Como fica isso na prática?

Vemos um exemplo que trata o ruído no ambiente de trabalho:

Determinada empresa por meio de sua metodologia de gestão (NHO-01 e NR 15) reduziu o agente agressivo, com ruído abaixo do limite de tolerância de 85 dB(A). Perfeito, ainda assim, há financiamento da aposentadoria especial e o pagamento de insalubridade ou periculosidade conforme o agente nocivo.

A Súmula 9 da Turma Nacional de Uniformização –  Conselho da Justiça Federal (TNU) sobre protetor auditivo x aposentadoria especial, firmou a tese:

O uso de EPI, ainda que elimine a insalubridade (exposição a ruído) não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado.

Lesões auditivas induzidas pelo ruído fazem surgir o zumbido, sintoma que permanece durante o resto da vida do segurado e, inevitavelmente, determinará alterações neurovegetativas e distúrbios do sono. Portanto, a fadiga dificulta a sua produtividade. Os equipamentos contra ruído não são suficientes para evitar e deter a progressão dessas lesões auditivas originárias do ruído, pois somente protegem o ouvido dos sons que percorrem a via aérea. O ruído origina-se das vibrações transmitidas para o esqueleto craniano e (…).” (Irineu A. Pedrotti, Doenças Profissionais ou do Trabalho, LEUD, 2ª ed., SP, 1998, p. 538).

Outros exemplos:

Não é possível dissociar o agente nocivo benzeno, composto químico da gasolina, no ambiente de um posto de combustível mesmo que o frentista utilize respiradores, luva, óculos de proteção, etc.

Ou mesmo o trabalhador de laboratório de análise clínica (exames sangue, fezes, urina). Mesmo que ele use luva, respirador e avental, ainda é necessário que a empresa continue pagando o financiamento do FACET e insalubridade. 

É o ambiente que define se o trabalhador está exposto e fará jus à aposentadoria especial, não o uso correto do EPI/EPC que eliminará o financiamento.

Aposentadoria especial x agentes químicos x EPIs

Ambiente exposto a agentes químicos:

Na análise do enquadramento de atividade em condições especiais os agentes reconhecidamente cancerígenos devem:

I – estar presentes no ambiente de trabalho com possibilidade de exposição; II – pertencer ao Grupo 1; III – possuir registro CAS; IV – constar no anexo IV do Decreto n° 3.048, de 1999. V – ser avaliado qualitativa ou qualitativamente; VI – ser enquadrado independentemente da adoção de EPC e/ou EPI eficazes; e VII – constar em períodos trabalhados a partir de 8 de outubro de 2014.

Se o agente químico estiver no anexo IV do Dec 3048/99 e na LINACH, o LTCAT é qualitativo e a simples exposição já dá direito ao trabalhador da aposentadoria especial.

Aposentadoria especial x Risco Biológico x EPIs

O manual de Aposentadoria especial do INSS, item 3.1.5, estabelece que:

não há constatação de eficácia de EPI na atenuação desse agente, deve-se reconhecer o período como especial; em relação ao EPC, deve-se analisar se confere a proteção adequada que elimine a presença de agente biológico, tal como cabine de segurança biológica, segregação de materiais e resíduos, enclausuramento, entre outros

Ficou complicado?

O mesmo agente dá direito ao adicional de insalubridade, mas não à aposentadoria especial.

Sim, a legislação não diz que aquilo que é insalubre dará direito à aposentadoria especial. São direitos distintos com embasamentos diferentes. A legislação da aposentadoria especial muda constantemente, enquanto a legislação sobre insalubridade é a mesma desde a década de 1970.

Comparemos duas situações: frentista de postos de combustíveis e vigilante armado em agência bancária.

Ambos recebem periculosidade de 30% sobre seu salário, diferentemente de insalubridade que é de 10%, 20% ou 40% sobre o salário-mínimo.

Ambos os profissionais estão expostos à perigo. Um por perigo de explosão entre outros, e o outro, por perigo de risco de morte por estar à frente da vigilância de uma agência bancária.

O frentista terá direito a aposentadoria especial e o vigilante/vigia/guarda armado não.

Analisando o ambiente de trabalho:

O frentista de posto de combustível está exposto a vários agentes químicos, dentre eles o benzeno, que é cancerígeno. Já o vigilante/vigia/guarda, não está exposto a agentes químicos.

TNU, Tema 282, em 05.05.22, fixou a seguinte tese:

A atividade de vigia ou de vigilante é considerada especial por equiparação à atividade de guarda (código 2.5.7 do Dec 53.831/64, até 28.04.95, independentemente do uso de arma de fogo, desde que haja comprovação da equiparação das condições de trabalho, por qualquer meio de prova.

De acordo com o CJF:

O enquadramento da atividade de vigia ou vigilante, exercida antes da Lei 9.032/95, não depende da utilização de arma de fogo, porém exige demonstração da sua equiparação à função de guarda, de forma a evidenciar que a atividade é exercida nas mesmas condições de periculosidade”. Processo 5007156-87.2019.4.04.7000/PR.

Aposentadoria especial após a Reforma da Previdência

O Supremo Tribunal Federal (STF) irá decidir se é possível a concessão de aposentadoria especial a vigilantes que comprovem exposição a atividade nociva com risco à sua integridade física, mesmo após a Reforma da Previdência (EC 103/19).

A matéria, discutida no RE-1368225, teve repercussão geral reconhecida (Tema 1.209), e a tese a ser fixada no julgamento de mérito deverá ser aplicada aos demais casos sobre o tema.

O recurso foi interposto pelo INSS contra decisão do STJ, que reconheceu o direito de um vigilante à aposentadoria especial. O Tribunal firmou a tese de que é possível, reconhecer a especialidade da atividade, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/95 e ao Dec 2.172/97, desde que comprovada a exposição permanente à atividade nociva e o risco à integridade física do trabalhador.

As normas deixaram de enumerar as ocupações e passaram a considerar como nocivos somente os agentes químicos, físicos ou biológicos, suprimindo a possibilidade de reconhecimento de condição especial de trabalho por presunção de avaliação de riscos.

No STF, o INSS argumenta que a profissão de vigilante se enquadra como atividade perigosa sem exposição aos agentes nocivos físicos, químicos ou biológicos e dá direito apenas ao adicional de periculosidade. A concessão do benefício apenas em razão do risco da atividade demandaria a edição de LC (art 201 §1º, II da CR/88), (redação EC 103/19), e geraria impacto de mais de R$ 154 bilhões, diluídos ao longo de 35 anos.

O ministro Luiz Fux observou que o tema não se restringe à análise de regras infraconstitucionais sobre a aposentadoria especial, mas diz respeito ao afastamento da especialidade da atividade de vigilante, pela inexistência de previsão constitucional para a aposentadoria especial por exposição a agentes perigosos.

Assim, cabe ao STF decidir sobre a compatibilidade constitucional que admita o reconhecimento da atividade como especial com fundamento na exposição ao perigo, seja em período anterior ou posterior à EC 103/19.

Podemos inferir que o enquadramento de atividade especial por categoria profissional foi extinto em 04/1995, Lei 9032/95, algumas atividades foram até 1997, Dec 2.172/97. Desse modo, caso o STF decida para esta atividade, outras tantas irão na mesma esteira. 

Haverá enxurrada de pedidos de revisão de aposentadorias no INSS, o impacto financeiro será gigante. Não haverá pedido de ressarcimento às empresas por parte da Receita e nem pelo INSS, portanto, a saída seria aumento da carga tributária. 

Neste aspecto reiteramos que o Brasil, diante das relações com os demais países, precisa dar segurança jurídica, por enquanto, vale lembrar que, após a EC 103/19 a aposentadoria especial passou a exigir também o fator idade do trabalhador, dificultando ainda mais sua aposentadoria mais cedo.  

Eder Daré é Advogado (OAB/BA 58.647) na SEG Advogados Associados.(contato@segecompany.adv.br)

 

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