A Covid-19 e as implicações na relação entre empregado e empregador

O Brasil atravessa o maior colapso sanitário e hospitalar da sua história, com impactos diretos não apenas na saúde e na economia, mas também nas relações interpessoais e nos padrões de comportamento.

A manutenção dos novos hábitos de higiene é determinante para minimizar o aparecimento de novas infecções e permitir a normalização das atividades econômicas com maior brevidade. Com o intuito de viabilizar a retomada, é notável o esforço dos empresários em adotar e dar visibilidade às medidas de proteção sanitária, transmitindo confiança e cuidado com os seus clientes e funcionários.

Apesar desse esforço pela proteção de seus colaboradores, vem crescendo o número de decisões judiciais relacionando o contágio pela doença à atividade profissional. De acordo com o Tribunal Superior do Trabalho (TST), por exemplo, foram 2.397 casos novos sobre Covid-19 distribuídos nas Varas do Trabalho (Primeira Instância) de todo o país, no primeiro trimestre, indicando um crescimento de 115% sobre igual período de 2020.

Um intenso debate surgiu após a publicação da Medida Provisória nº. 927, de 22 de março de 2020, a qual previa, em seu art. 29, que os casos de contaminação pelo coronavírus (Covid-19) não seriam considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.

Mas em 29 de abril de 2020, a partir de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em sede de julgamento de sete Ações Diretas de Inconstitucionalidade, tal dispositivo teve sua eficácia suspensa em caráter liminar. A decisão resultou no fortalecimento dos auditores fiscais do trabalho, vinculados ao Ministério da Economia, para que pudessem realizar as fiscalizações necessárias com o intuito de verificar, inclusive de forma preventiva, se os empregadores estão tomando os cuidados cabíveis para a proteção de seus colaboradores com vistas à prevenção contra a Covid-19.

Após suspender as atividades produtivas de uma filial em junho de 2020, a Justiça do Trabalho de Ji-Paraná (RO), em março de 2021, mandou uma empresa pagar 20 milhões de reais em indenização por danos morais coletivos após um surto de Covid-19 em uma unidade de bovinos da empresa, situada no município de São Miguel do Guaporé, de acordo com uma cópia da decisão vista pela Reuters.

Na grande São Paulo, foi proferida uma decisão do juiz Willian Alessandro Rocha, da 1ª Vara do Trabalho de Poá/SP, do Tribunal do Trabalho da 2ª Região, após o ajuizamento de uma Ação Civil Pública, movida pelo Sindicato dos Trabalhadores da Empresa Brasileira de Correios Telégrafos e Similares de São Paulo (SINTECT-SP) contra os Correios.

O magistrado reconheceu a natureza ocupacional do contágio da Covid-19, entendendo que os Correios não adotaram medidas para reduzir os riscos de contágio, e determinou que a empresa realizasse testes para detecção da Covid-19 em todos os empregados de uma unidade, além de determinar a adoção de ações de prevenção.

Em suas decisões, juízes têm considerado “muito provável”, a contaminação dos funcionários no exercício das atividades laborais, isto é, reconhecendo o nexo de causalidade entre a transmissão da infecção e desempenho das atividades.

Na Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME, a Coordenação-Geral de Benefícios de Risco e Reabilitação Profissional, ligada à Subsecretaria do Regime Geral de Previdência Social, concluiu que: “Ante o exposto, resta evidenciado que “à luz das disposições da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, a depender do contexto fático, a covid-19 pode ser reconhecida como doença ocupacional,aplicando-se na espécie o disposto no § 2º do mesmo artigo 20, quando a doença resultar das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relacionar diretamente; podendo se constituir ainda num acidente de trabalho por doença equiparada, na hipótese em que a doença seja proveniente de contaminação acidental do empregado pelo vírus SARS-CoV-2 no exercício de sua atividade (artigo 21,inciso III, Lei nº 8.213, de 1991); em qualquer dessas hipóteses, entretanto, será a Perícia Médica Federal que deverá caracterizar tecnicamente a identificação do nexo causal entre o trabalho e o agravo, não militando em favor do empregado, a princípio, presunção legal de que a contaminação constitua-se em doença ocupacional.”.

Assim, diante do risco eminente da imputação de responsabilidade, o que a empresa pode fazer para proteger seus funcionários e ao mesmo tempo se resguardar de eventuais ações trabalhistas? Abaixo seguem algumas medidas importantes.

  • Estabelecer um protocolo técnico eficiente com medidas de proteção contra à COVID-19;
  • Elaborar manuais e procedimentos operacionais padrão elucidando de forma clara todas as medidas a serem adotadas;
  • Capacitar seus funcionários quanto às medidas de proteção;
  • Adotar uma gestão pautada pelo Compliance de forma a se adequar à legislação vigente;
  • Implementar sinalizações visuais eficazes para a orientação de todos;
  • Fornecer os Equipamentos de Proteção Individual (EPI) para uso nas atividades laborais;
  • Fiscalizar e notificar os colaboradores que não estiverem cumprindo as medidas estabelecidas;
  • Implementar todas as medidas de prevenção contra riscos higiênico-sanitários e lembrar que não existe apenas a COVID-19.

Todas as medidas citadas devem ser elaboradas por uma equipe capacitada e precisam ser formalizadas para comprovações futuras. Mediante a urgência imposta pela pandemia, muitos adotaram soluções “milagrosas”, medidas sem efetividade e até a utilização de produtos e equipamentos não autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o que agrava o risco de contágio e aumenta a exposição das empresas resultando em processos trabalhistas.

Ao privilegiar a adoção de medidas sanitárias eficientes para proteger seus colaboradores, a empresa fortalece a sua imagem institucional, zela pela manutenção dos postos de trabalho e contribui para a retomada da economia do país.

Por: Ellen Sucasas – em 18/05/2021.

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